20 agosto, 2013

Leandro Narloch - O "guia correto" do Idiota burguês neoliberal do Brasil

Leandro Narloch - O "guia correto" do Idiota* burguês neoliberal do Brasil



por Cláudio R. Duarte

                                        "Nunca houve um monumento da cultura que não fosse também um monumento da barbárie. E, assim como a cultura não é isenta de barbárie, não o é, tampouco, o processo de transmissão da cultura. Por isso, na medida do possível, o materialista histórico se desvia dela. Considera sua tarefa escovar a história a contrapelo." (Walter Benjamin,  Sobre o conceito da história, Tese 7, 1940).


A direita liberal -- protofascista desde as suas mais profundas raízes -- vem renascendo com vigor no mundo todo nas últimas décadas, principalmente após a derrocada do socialismo de caserna no Leste e do triunfo da ideologia neoliberal.



Como é de se esperar em tempos sombrios e regressivos como esses, o livro do jornalista Leandro Narloch -- Guia politicamente incorreto da história do Brasil [1] -- tem todos os ingredientes para se tornar, como vem se tornando, um best-seller do marketing reacionário. Com a força de outros “intelectuais” da direita militante (Reinaldo de Azevedo, Augusto Nunes, Marco Antônio Villa, Bolsonaro, Olavo de Carvalho, Diogo Mainardi, Luiz F. Pondé, Eliane Catanhêde), ele vem gerando muitos entusiastas e sequazes, encorajando-os a mostrar a sua careta incivil, apolítica, individualista e concorrencial sem freios.



Nada de novo no front se contarmos o liberalismo como a forma mais natural e mais pura da consciência coisificada do sujeito burguês moderno, aprisionado ao caráter fetichista das relações sociais mercantilizadas. O que é novo no neoliberalismo, talvez, é a sua fé cretina incondicional na selvageria do mercado como a única alternativa de vida possível. É esse o pano de fundo mais ou menos confesso do livro, reduzindo a esquerda à burrice e ao pesadelo totalitário.

 


No livro de Narloch, os homens são e serão o que sempre foram na sociedade burguesa: acumuladores de dinheiro e poder -- tudo sem muita angústia, muito menos drama --, embora sempre com alguns laivos de um tênue espírito de cidadania ou mesmo de nacionalismo, confundido com a admiração pelos feitos da elite nacional. Com o que estamos muito próximos do ideal da nação grandiosa (o gigante verde-amarelo) há muito desbotado pela globalização, e que a introdução da obra prometia engavetar. Apesar do título do livro, afinal, o que pode haver de incorreto em tudo isso? A pretensão de ser politicamente incorreto é puro marketing. O que há é a propaganda ostensiva do conservadorismo e da normalidade capitalista, isto é, a glorificação dos velhos temas da história oficial positivista retomados de maneira polêmica, em chave revisionista, contra a crítica social da esquerda.
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Assim, o que haveria de incorreto com os bons colonizadores portugueses, que mesmo sendo escravistas nem sempre “levavam a melhor” sobre os seus escravos?!; ou com os valentes bandeirantes paulistas, que, miscigenados e muita vez maltrapilhos, ajudaram a formar a grande terra brasilis e a civilizar os índios (estes sim, derrubadores de floresta); ou ainda com a Inglaterra, a maior interessada no fim do tráfico negreiro por motivos humanitários!? Aliás, ficamos sabendo por meio de Narloch que os portugueses aprenderam e desenvolveram efetivamente o tráfico de escravos com os africanos, além do fato que no longo processo de sua abolição estes lutaram contra o fim da escravidão... O que isso significa em termos de reversão do sentido funesto do escravismo colonial? Em que isso desmentiria a dominação europeia sobre a África? Para o autor isso tudo não vem ao caso, o que importa é trazer dados supostamente novos e desconsiderados pelas correntes críticas das ciências sociais (que na verdade são bem conhecidos, sim, desde pelos menos os anos 1960). E o que haveria de incorreto com o nosso Segundo Reinado, com D. Pedro II e com a elite liberal-conservadora, que evitou "revoluções e reformas radicais", garantiu as "liberdades individuais"(p.274) e a "liberdade gradual dos escravos" (p. 288)?! Sim, por que não, a liberdade de senhores patriarcais, os donos de capital humano, sem vergonha de pertencerem à sua classe... O que pode haver de indigno, enfim, com a "ditabranda" (sic, p. 324), segundo as versões altamente suspeitas da Folha, do Coronel Brilhante Ustra, chefe do Doi-Códi, ou de Marco Antônio Villa (o historiador predileto da Veja), todos citados como fontes fidedignas – um regime militar que torturou “apenas” uns 2 mil bandidos e desocupados, matando só mais uns 380 membros da esquerda “violenta” e “autoritária” de vocação stalinista e polpotiana, uma ditadura que "foi uma das menos atrozes de todo o século 20"(!, p. 324), e que enrijeceu somente após 68, como mera reação à guerrilha revolucionária, enfim, um regime modernizador e portanto progressista, que teria feito aumentar e redistribuir a renda nacional na época do milagre brasileiro!?[2]

Desse modo, muito pouco há de politicamente incorreto em tudo o que essa versão requentada da História Oficial, escrita pelos vencedores de sempre, sempre nos contou. Daí a conclusão do livro há muito deduzida e esperada pelo leitor crítico: "Viva o Brasil capitalista" (p. 336).
O pressuposto cego desse livro que se quer “tão sábio” e “tão esperto” (com algo mesmo da cegueira nietzscheana) é que as relações sociais fundamentais só podem existir de fato como relações entre as coisas no mercado, como troca coisificada entre pessoas privadas, entre mônadas funcionais que despendem e fazem circular trabalho humano homogêneo, igual, abstrato. Assim, tudo e todos praticamente se equivalem somente na medida em que são seres que trabalham, embora uns valham mais e tenham justamente mais liberdade do que outros. A elite conservadora do país seria então exemplar, mesmo sendo o paradigma máximo do privilégio da vida ociosa fundada na dominação de classe e do capital. Por isso, ainda, para o jornalista, o tráfico negreiro parece ser no fundo uma troca justa entre potentados europeus e reinos africanos, que preservavam interesses autônomos iguais – ou pior, é como se a gênese do processo de acumulação capitalista tivesse realmente mais a ver com a vontade de lucro e de luxo dos reis africanos do que com as leis capitalistas da acumulação e as imposições do sistema de plantations, ou seja, é como se a África fosse um parceiro comercial soberano, não submetido à Europa e ao controle do Capital, enfim, como se o trato negreiro não constituísse parte fundamental da lógica alienada da valorização, que no limite inverteu os termos entre produção colonial e o comércio altamente lucrativo de escravos.[3] Tudo se passa como se a colonização não fosse um processo de exploração e pilhagem do Brasil e da África regido por decretos e leis administrativas, aliás, o tempo todo suspensas e sujeitas ao arbítrio e ao capricho dos proprietários, um laboratório do atual estado de exceção normativo do capitalismo mundializado. Como se aqui, então, os índios e os negros transformados em escravos fossem, via de regra, bons "amigos"(sic!) de seus senhores e não tivessem resistido e lutado contra o seu cativeiro, um raciocínio esdrúxulo, na pior tradição freyriana reabilitação da escravidão.
 
Aos trocadores de mercadorias, como mostrou Marx, o valor aparece como uma propriedade natural das coisas (incluindo aí a própria força de trabalho), assim como o mercado aparece como um sistema que serve verdadeiramente aos homens de maneira totalmente justa, conforme o que cada um exige e tem a oferecer ao mercado. O neoliberal radicaliza a crença idiota nessa justiça (supra)terrena, praticamente excluindo o campo dos ideais e a aura burguesa dos direitos e da civilidade, o que Narloch e a mídia em geral entendem pelo que é socialmente justo ou politicamente correto, que nada mais é que um ressentimento dos pobres, que adotam o falso "papel de vítimas ou bons mocinhos"(p.26). Narloch suaviza o terror capitalista, tendendo a tomar a exceção pela regra, o caso contingente e singular pela essência. Se o neoliberalismo é o pensamento e a prática que afirmam secamente a concorrência, reduplicando de modo cínico a ideologia materializada pelas relações sociais naturais do sistema produtor de mercadorias, o jornalista cria uma série de álibis para ele, com vários graus de hipocrisia e cinismo, para justificar uma hegemonia de classe e um novo conformismo histórico.
Não há nada de politicamente errado com o sistema existente. Para o neoliberal não pode haver injustiça no mercado ou nos empreendimentos comerciais em si, que geram a acumulação social de riqueza (-- como capital privado, é verdade). O injusto é sempre um justo resultado das ações livres de cada um: o resultado do empenho diferencial e naturalmente desigual de cada competidor no mercado. Eis o que o converte em um neodarwinista social radical ou potencialmente radical e, assim, em um protofascista. Para tal caráter autoritário, como escreveram os frankfurtianos, “a celebração do poder e a irresistibilidade do mero existir são as condições que levam ao desencanto. A ideologia já não é um envoltório mas a imagem ameaçadora do mundo”, restando então “o pensamento estereotipado, o sadismo encoberto, a adoração da força, o reconhecimento cego de tudo o que é eficaz”.[4] Os portugueses e os bandeirantes foram muito eficazes em sua empresa, mais que os índios nativos, isso é o que importa. Também os índios buscavam vantagens o tempo todo, e “o extermínio e a escravidão indígenas”, segundo o autor, “não seriam possíveis sem o apoio dos próprios índios, de tribos inimigas” (p. 39), com o que praticamente desaparece a sua coisificação e sujeição aos interesses capitalistas dos colonizadores.


Também o golpe militar e até a tortura rotinizada tornam-se mais ou menos justificáveis porque foram eficazes em preservar o mercado e a propriedade privada: “Alguém poderá dizer que a reação dos militares ao terrorismo foi exagerada. (...) Isso pode ser verdade, mas não era seguro pensar assim naquela época. Qualquer notícia de movimentação comunista era um motivo razoável de preocupação” (p. 321). O “trator” da ditadura sai legitimado: “Se o governo e a sociedade brasileira mantiveram o país longe dos comunistas, existe aí um motivo para nos sentirmos aliviados: o país pôde avançar livre dos perigosos profetas da salvação terrena” (p. 336-7). A injustiça social surge apenas quando o Estado ou as estratégias políticas intervêm no mercado ou este último é regulamentado por normas sociais universais – em suma, por algum tipo de relação social totalizante exterior ao mercado, que pode bloquear ou impedir os negócios. A injustiça seria apenas o que interfere na livre iniciativa -- ou antes, no capricho dos proprietários. (E por que não?, aquilo que interfere no capricho dos jornalistas que podem também retrabalhar e remendar à vontade os processos históricos, a fim de criar, como fofocas da vida privada, as suas próprias versões da história).
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Não é que o livro de Narloch trabalhe com fatos mentirosos ou fantasiosos. Sua interpretação é que é uma lástima. Ocorre que a verdade objetiva e contraditória do processo não conta: o que vale é a narrativa apimentada a partir de fatos isolados, retirados de seu contexto e do sentido geral do processo, que é profundamente negativo. O que merece crédito é a provocação, o dado sensacional e de fácil digestão no mercado, já sem o pau chutado da barraca das estruturas históricas fundamentais. Tudo seria uma questão relativa de ponto de vista -- e já não há qualquer visão de totalidade possível, qualquer distinção entre essência e aparência, regra e exceção, que permita revelar processos sociais contraditórios, que confirmam os fenômenos e as aparências diversas, mas não os toma como a essência ou como capazes de dissolver o sentido mais geral do processo capitalista de acumulação. De resto, o livro é bom em levantar falsas polêmicas como as do jovem Machado de Assis como “censor do Império” (como se este não fosse o maior crítico dos costumes da burguesia nacional e do próprio Império), ou sobre qual era o “verdadeiro” caráter de Zumbi, Euclides da Cunha ou José de Alencar (como se as suas obras se reduzissem à biografia dos autores), qual a validade estética e a quem atribuir as muitas obras de excelência do escultor Aleijadinho (segundo Rodrigo Naves, um dos maiores artistas plásticos brasileiros), ou qual é a “verdadeira origem" do samba e da feijoada (como se eles não tivessem se desenvolvido e proliferado precisamente entre as camadas populares -- e não a partir de ações da elite ou do fascismo de Vargas).

O livro funciona, assim, como guia de mistificação para os típicos leitores há muito cegos da revista Veja. Como sempre, eles estão sedentos pela justiça da troca de equivalentes. À consciência fetichista segue-se o discurso apologético de que tudo se deu no final das contas de maneira racional e progressista desde a colonização -- a não ser por distúrbios da lógica da equivalência, como no caso do Acre, p.ex., que paga muito menos impostos do que recebe de investimentos do governo federal: "Já o Acre, produtor de uma borracha mais cara, nunca mais daria dinheiro" (p.235). E o mesmo para outros Acres vagabundos, parasitas da nação: “Rondônia, Roraima, Amapá, Tocantins, Alagoas...” (p. 239); com o que o velho desejo separatista do Sul e Sudeste ganha novo alento. Aliás, o exemplo citado dos quilômetros de metrô que poderiam ter sido feitos em São Paulo com esse dinheiro hoje vem bem a calhar no livro de Narloch, que não esconde suas preferências tucanas. 


O mesmo para o caso dos guerrilheiros-terroristas contra a Ditadura, que apenas sangram os cofres públicos com indenizações, sendo verdadeiros heróis os militares, que defenderam a nação contra o espectro do comunismo (claro que distorcendo o processo real em curso, meramente reformista, legitimando assim a contrarrevolução preventiva e silenciando toda a conspiração imperialista arquitetada por Washington no caso). Narloch, como os liberais desde Adam Smith, recalca e esquece, assim, que o que se ergue a partir de suas honoráveis relações coisificadas só pode ser um processo social autonomizado, alheio ao controle de todos -- essa a verdadeira ditadura sanguinária, que ganha a vida própria de um deus-fetiche da acumulação – e que foi recuperado e reempossado manu militari através do golpe de 1964. Um processo objetivo que os neoliberais simplesmente idolatram e transfiguram fantasiosamente como a "mão invisível"... não da escravidão e do infortúnio coletivos, mas da justiça e da democracia...
Para o neoliberalismo, tudo isso tem seu ponto de partida nos atos livres do indivíduo burguês. Eis então um modo relativamente simples de equacionar os processos sociais opacos e hipercomplexos: as estruturas são redutíveis a ações individuais, a atos voluntários, a interesses particulares - ou, na versão de Narloch, a feitos individuais bem-sucedidos ou malogrados (a guerra do Paraguai como culpa de um tirano, p. ex., ou as bandeiras como empreendimentos heroicos de gente chã e pedestre -- dois massacres históricos aliás praticamente inexistentes, segundo sua visão “alternativa” dos fatos etc. A estrutura desaparece sob indivíduos e fatos contingentes ou evanescentes. Como dizia Margareth Thatcher, a sociedade é uma ficção, o que existe são indivíduos isolados e suas ações independentes -- que podem ser interpretados ao bel-prazer do historiador.
 
Da mesma maneira, o fracasso é sempre individual, ou seja, é culpa dos próprios indivíduos que não deram duro o bastante para afirmar a sua liberdade -- nunca é o resultado de um mecanismo social cego, alienado, monstruoso, que corre por trás das costas dos envolvidos. O que se afirma é a eternidade do atual curso do mundo, tido como o melhor dos mundos possíveis. O que se afirma é, como viu Chico de Oliveira, uma "subjetividade antipública" e uma ideologia da "impossibilidade do dissenso"[5] -- aqui, sob as vestes esfarrapadas do jovem rebelde que só aparentemente destrói o grande consenso, já que apenas o simula destruindo a objetividade da história e a universalidade da luta pelos direitos sociais. Num outro texto, aliás, após a eleição de Dilma, o autor exala todo o seu preconceito antipobre: "seria ótimo não precisar conviver com os 30% de eleitores que, segundo o Datafolha, não se lembravam, duas semanas depois da eleição, em quem tinham votado para deputado" ("Sim, eu tenho preconceito", Folha de São Paulo, 11/11/2010). Ocorre que também a classe média idolatrada não sabe em quem vota, quando vota na quadrilha campeã em corrupção de FHC, Serra, Alckimin e Aécio, como vem se revelando nos últimos anos.

A hegemonia cultural da esquerda, segundo Roberto Schwarz operante em determinado momento dos anos 60, foi há muito desfeita.[6] O clima difuso do livro é um profundo sentimento reacionário e antipopular. Um sentimento de um povo, que, vitimizado e heroicizado pela historiografia populista ou crítica -- na verdade teria sido um povo reacionário como seu autor: um povo feito de índios exterminadores de índios, de escravos traficantes de escravos, mais tarde malandros da trapaça e do parasitismo social. Um sentimento, em suma, de que esse povo foi via de regra estúpido e patético. E que formaria hoje um exército disfuncional para o sistema -- aqueles 40 milhões, metade da PEA nacional, que o então presidente FHC chamou de “inempregáveis”.


De fato, tão inempregáveis quanto o capital improdutivo, que "vagabundeia" especulativamente de bolsa em bolsa, apartado do mundo, no contexto da crise estrutural do capital -- a verdade "desagradável" maior, que o livro furioso de Narloch desconhece totalmente. A direita, com sua idiotia congênita mais uma vez revelada, louva a si própria como mero Capital personificado, e assim vai consolidando o seu "sonho de um apartheid total"[7].
Notas:



* Do latim idiota, originado do grego antigo ἴδιώτης (idhiótis), "um cidadão privado, individual", derivado de ἴδιος (ídhios) , "privado". Usado depreciativamente na antiga Atenas para se referir a quem se apartasse da vida pública.

[1] NARLOCH, Leandro. Guia politicamente incorreto da história do Brasil. 2.ª ed. revista e ampliada. São Paulo: Leya, 2011. Doravante, cito as páginas no corpo do próprio texto.
[2] Há momentos no livro de franco disparate no uso e na interpretação de números estatísticos. Como no exemplo do milagre brasileiro (p.332-3). Em 1970, os melhores críticos já viam que, apesar dos progressos urbano-industriais qualitativos, o processo autoritário de modernização era desigual e conservador, combinando “altas taxas de incorporação [de trabalho], expulsão e marginalização [social]”, concentrando a renda e “visando implícita ou explicitamente ampliar o mercado das classes médias, intensificar a capitalização e promover uma nova onda de expansão” fundada necessariamente nessa desigualdade (TAVARES, Maria da Conceição. Da substituição de importações ao capitalismo financeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1975, p. 194). Ou ainda, como apontava Paul Singer: “Não há como desconhecer que a política trabalhista posta em prática após 1964 foi um importante fator para que a economia alcançasse elevadas taxas de crescimento de 1968 em diante. Os autores da proeza – os trabalhadores – sofreram sensível piora em suas condições de vida”, vale lembrar, assentadas no “arrocho salarial”, na “intensificação da exploração”, no “avultado número de acidentes de trabalho”, enfim, na “maior subordinação e controle do trabalhador à disciplina da empresa e da polícia”, e que ao longo das décadas levou à superconcentração do capital, à superinflação e ao megaendividamento do país. (Singer, Paul. A crise do ‘milagre’. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976, 77-88). Para Narloch, o milagre brasileiro teria muitos “números saborosos” e seu mérito “não é tanto dos militares e sim dos empresários, dos trabalhadores e da multinacionais” (p. 333). Ou seja, aqui, os trabalhadores são apenas mais um elemento da equação montada por verdadeiros parceiros sociais, postos em igualdade abstrata com o capital e a classe dominante, agentes que teriam sido beneficiados amplamente – sim, pode-se rebater, basicamente a classe média e o empresariado, que constituem hoje o público alvo de seu livro, as classes ainda hoje saudosas do regime que fez crescer os seus privilégios.
[3] Cf. Novais, Fernando. Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial. São Paulo: Hucitec, 1979. Cf. Alencastro, Luiz Felipe. O trato dos viventes. Formação do Brasil no Atlântico Sul – séculos XVI e XVII. São Paulo: Cia. das Letras, 2000.

[4] Adorno, Thedor W. & Horkheimer, Max. “XI-Preconceito” e “XII-Ideologia” in:__. (org.). Temas básicos da Sociologia. São Paulo: Cultrix, 1973, pp. 203 e 176, respectivamente.

[5] OLIVEIRA, Francisco de. Os direitos do antivalor. (A economia política da hegemonia imperfeita). Petrópolis: Vozes, 1998, pp. 220-1.
[6] SCHWARZ, Roberto. "Cultura e política - 1964-1969" (n:__. O pai de família e outros estudos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
[7] OLIVEIRA, op. cit., p. 203.