11 março, 2018

O ANCAP COMO ESPÍRITO ANIMAL EXEMPLAR DO CAPITALISMO BRASILEIRO ATUAL



O ANCAP COMO ESPÍRITO ANIMAL EXEMPLAR
DO CAPITALISMO BRASILEIRO ATUAL

Sempre estranhei a obsessão desses novíssimos liberteens e ancaps em cima da autopropriedade, o discurso repetitivo sobre "ferir as regras do PNA" (Princípio de Não-Agressão), em uma comunidade de gente solitária, apenas linkada pela web, sempre hiperagressiva, conservadora e reacionária, amante da mamãe ou da violência e dos temas de segurança privada, em grupos de maioria classe média, branca, racista e quase idêntica, seja aqui ou lá fora.


Não são figurações do narcisismo contemporâneo? Em Esaú e Jacó, de Machado de Assis, temos irmãos gêmeos e um par de famílias vivendo em um espaço segregado, narcísico e ordenado por definição, em que se produz o completo desaparecimento e aniquilação do outro. Um espaço de "amor materno", por um lado, que remete ao gozo sem travas da casa grande, e de rixas, trapaças e golpes rotinizados entre os dois irmãos, por outro.


Lá como cá, temos o narcisismo de um Eu sitiado e a construção de um território murado e administrado, de defesa contra todo tipo de alteridade.


ESTE belo texto de Serge Leclaire dão uma luz sobre esse tipo de sujeito:


"Que angústia! Vivemos num mundo em forma de mãe! A sala, sua casa ou seu apartamento podem ser um espaço matemo. Aliás, a empresa na qual você vive também é um sistema que pode servir de mãe, boa ou má.

A angústia do homem produz esse tipo de construção. Por que ele é obrigado a ver mãe em todos os lugares? É porque ele possui um órgão o qual tira um pouco de prazer e sua anatomia lhe dá um pênis, sempre grande, é claro! Por esse pedacinho de corpo que lhe dá um pouco de prazer, ele quer acreditar que detém a chave do paraíso. O paraíso é o outro mundo; ele tem a chave, ou pelo menos supõe que tem a chave do céu, como são Pedro. Para ele, é muito importante defender esse sonho.

Mas, ao mesmo tempo, ele tem consciência de que não detém a pedra filosofal. Não conhece a fórmula mágica com que sonham todos os sonhadores. Assim, é importante dar uma realidade ao seu sonho, defender o pouco prazer que pode ter.

A mãe é uma boa imagem de um paraíso ou de um inferno. Para manter esse sonho, tudo, o mundo inteiro se torna então representação desse pedacinho do céu, desse outro mundo que é o corpo materno. A representação da mãe se torna o grande ídolo, e a atividade do homem consiste em fabricar ídolos, seja um metrô ou um arranha-céu, um sistema filosófico bem fechado ou uma teoria pessoal. Sua grande atividade é construir espaços fechados. A mãe, nesse sonho, é verdadeiramente o modelo universal que ordena o dentro e o fora, que nos dá até uma representação das leis da gravitação, um centro, uma periferia; a gravidade natural do homem o faz voltar para esse espaço mítico, a fim de
manter o seu sonho. (...) Sobre esse mundo feito de lar, casa, propriedade, refúgio, o homem reina, como os reis do Ancien Régime, segundo o seu "bel prazer". O homem constrói assim um mundo de imagens que produz coisas extraordinárias". 
(Serge Leclaire, "Narcisismo" in: Escritos clínicos, [1996/8]; Zahar, 2001).

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